Carneiros: aqueles que comem
carne em tanto excesso que seus pelos engordam. Não que carne engorde, na
verdade carne é sempre um estado de vida e por isso uns gostam de comê-la em
sangue vivo. O sangue vermelho e quente escorre a cada mastigada. A cada moer,
gemendo. Mas, nem preciso de tanta descrição agora. Eu me remoía toda ao olhar
para frente e ver que esses olhos me viam. Eu ficava preocupada se eu estava
apresentando aspecto agradável. Às vezes eu me rendia pensando no passado. Com
falta de alguma coisa que ainda quer crescer. Tinha dias que eu não me acordava com
o desejo mais firme de acordar. Tinha dias que eu corria para dentro de mim,
para me esconder tanto ao ponto de me perder e desaparecer. Como que achando um
caminho para o sumiço. A imagem é um pouco com a da Alice entrando no mundo das
maravilhas. Eu vinha me escapando de mim. Correndo para dentro de um mundo
irreal que só existia em minha cabeça. E eu te olhava... Como quem quer saber
mais sobre como a gente foi se encontrar assim. A impressão era que talvez a
gente não pudesse se cruzar em momento pior. Parece-me que as coisas vão
escapando. Cada vez eu vou sentindo mais certeza. Essa bendita existência do
tempo. E eu já lembrava: tempo não é o que passa, mas sim o que vive. Eu pouco
tinha vivido, mas já entendia um bocado do que fazia e um pouco de tempo que às
vezes perdia. Eu pensava sempre: Mas por quê? Como assim? Hã? O mundo queria me
explicar melhor colocando algumas situações que poderia me fazer uma louca, ou
qualquer outra pessoa desprezível. Sentia vergonha do que às vezes lembrava e
só agora, nesse momento da vida e nas reflexões, gostava de lembrar e saber que
essa vergonha já passou. Eu passava horas lembrando e rindo. Voltava em algumas
histórias morrendo de rir. E você continua me olhando. Eu poderia passar mais
um tempo olhando até que minha boca atrevida pergunta: o que foi? Como assim? O
que foi sua lesa? Eu me perguntava em pensamento depois de deixar escapar a
curiosidade infantil que invadia e transbordava. Tenho a impressão que isso foi
dito. Pelo menos o gesto que sempre faço quando pergunto isso saiu. Levantei
meu queixo como que apontando para algum lugar. O lugar que eu apontava era
para os seus pensamentos. Queria entrar lá dentro e saber o que realmente se passava.
Essa mania de historicizar tudo, ver os contextos e as fontes sempre me
colocavam em situações constrangedoras. Ai que vergonha! Mais uma vez pensei. Para
fugir da responsabilidade de minha ação me perdi pensando o que você poderia
estar achando de minha inocência. Pois para mim você tanto poderia me achar
muito interessante ou desinteressante. Foi nesse momento que eu reconheci o
mistério do seu olhar. A energia centrada que eu sentia no seu abraço agora
encontrava nome: mistério. Nem sabia eu como agir ou o que pensar. Tentava
pensar positivamente, pois riamos e eu abaixava a cabeça como que para mudar de
capitulo, mudar de assunto e acabar com esse momento que só ficaria escrito em
minha memória.
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